sexta-feira, junho 22, 2007

ENSAIO

Sociedade do controle. Aéreo.

Umas três da matina, final de maio, toca o telefone. Levanto, puro pavor, ‘um frio dos inferno’, como diria Gilbertão, casa de madeira, vou até a sala, que, pra mim, celular é coisa de que não preciso e também não sou um consumista além do necessário. No lusco-fusco da luz dispersa da cidade que entra pela janela sem cortinas, retiro de qualquer jeito o telefone do gancho. Alô... Só falta você adivinhar quem era. O próprio.
Tinha uma teoria revolucionária e originalíssima a respeito do crescimento da violência a partir da crise do setor aéreo. Ahhh...! Ãhram...!
Veja bem, é muito simples e eu sei que é meio tarde, mas prometo: só cinco minutinhos. Qual é o grande problema na crise do setor aéreo? O controle do tráfego aéreo, não é? Pois é. E quem controla o trafego aéreo? Os tais controladores de vôo. Até aí tudo bem. Acontece que, em si, controle não é nada, depende sempre de um ou mais indivíduos no estabelecimento de suas funções ou, no plano tecnológico, na especificação e desenvolvimento de certa autonomia. Não é isso? Muito bem. Ocorre que, certamente você já leu Deleuze sobre a sociedade do controle, pois é, esse momento de transição da sociedade da disciplina para a do controle coincide com a dita crise aérea. Ora, cadê a disciplina dos controladores. Enquanto houve disciplina não se ouviu falar em crise, não é mesmo? Será que...
Já termino, não posso perder a linha de raciocínio. É isso, nem só disciplina e nem só controle, tem de haver sensibilidade humana. Percebe onde quero chegar? Disciplina e controle no tráfego, no fluxo, seja lá do que, não significa rigidez cadavérica. A sensibilidade é contingente, considera o entorno, a trajetória, não se presta ao conceito de produto. Você não acha que em metáfora de vôo, a exacerbação do controle na sociedade significa, cada vez mais, essas balas que interceptam vôos tenros?
Eih...! Alô...! Aaaalô...! Dormiu...?!


Roberto Bittencourt
Poema pomes

Ante a solidão inexata
sem destino destravam-se ao futuro
células de corpo pó ao
sopro e trato de tempo sem dó.

Beijo e bocejo plástico
trazidos das dobras do verso
atinam tino, brotam brotos e
o vaso sobre a palidez da fórmica.

Custa medo o sentido
muro, manhã cedo, assoviar canção
de taipa, tapar de tripa trilha
que leva só ao espetáculo.

Ordem ardor aplauso
caos de flâmula e fórmula
opinião suspensa e festiva na cal
da praça da Paz Celestial.

Mãos sobre mesa e
cidade roucas de esperança
verdejante, século de outras tormentas
embalam profundo e adjacente.

Tabuleiro e mesa de
prostíbulo, caixão mantimento,
assoalho palco, passarela ela passa
palavra se fez, que se faz, que se faça.

Salve tropeço, pedaço
de carroça, exercício olho cada poça
sem traço, cadeia cheia
e a vida nos Estados Unidos.

Tomada fotográfica
válida vinda da universidade bebida
em taça e luz de poste cheia voam
matemáticos e físicos num alvoroço.


Roberto Bittencourt