quinta-feira, agosto 18, 2011

A Morte de Pedro Ninguém

Luiz Menezes
 
Veio a cantiga da noite
Na garupa do aguaceiro
Cabresteada pelo vento.
Até um relâmpago alçado
Andou pateando o espaço
Preludiando temporal...
 
Mais “oigatê” como é brabo
Este tal do mês de agosto!
 
A voz do preto Clarindo
Veio do fundo do rancho
Que se velava o finado:
- Ô Juca, vai lá na venda,
Compra dois real de “gayeta”
E um naco de fumo grande,
Que a noite vai ser comprida...
 
Lá fora o céu era negro
Assim como um campo grande
Que fora queimado há pouco.
O Juca pediu a bênção
Pra seu padrinho Clarindo
E se enfurnou noite-a-dentro
Na direção do bolicho.
 
Agora só a luz das velas
Clareava os rostos sombrios
Da peonada no velório
Onde o respeito era pouco!
Pois entre risos e ditos
Iam se contando causos
De peleias, de carreiras
E de chinas mal-domadas;
Esquecidos do finado!...
 
Foi quando o preto Clarindo
Compreendendo o desrespeito
Pelo coitado do morto,
Tirou uma longa tragada,
Pigarreou - como pensando –
Para afinal sentenciar:
 
- O homem que nasce pobre
É como cavalo xucro...
É pealado pela vida,
Sofre a doma das tristezas...
Até que um dia se amansa
Perde a vontade e a fé...
Depois já sem serventia
Morre à beira do alambrado
Esquecido... sem ninguém.
 
Vejam vocês, nessa noite
O Pedro já não existe.
Amanhã se vai o corpo,
Pois a alma do coitado
De há muito já estava morta.
Andava assim como andam
“Miles” de guascas sem rumo,
Fugindo pelos atalhos
Do povoado... das taperas ...
 
Bueno... total é a vida!
Amanhã será um de nós...
 
Até a viúva quando saiba
Que o pobre Pedro morreu
Decerto vai chorar pouco.
Chorar é pra quem tem tempo
E o tempo pra o pobre é escasso
Para se lastimar à toa,
Quando já não tem remédio
Nem esperança num cobre ...
 
Livino! Me passa a canha
Que é pra esquentar o pensamento...
Caramba! Como faz frio
Neste tal do mês de agosto!...
 
Um trovão rolou no espaço
E a chuva seguiu cantando
No funeral da saudade...
Saudade? Ora saudade!...
A saudade não tem tempo
De chorar, Pedro Ninguém!