terça-feira, setembro 19, 2006


A responsabilidade das atitudes no meio social se verifica, do ponto de vista de privilégios cívicos, em conformidade com os códigos geradores de tais privilégios. Isso quer dizer que, ou se elevam os patamares de observância na promoção do civismo à condição de prosperidade humana ou permanecem os equívocos por conta de julgamentos preconceituosos.

O ser cívico prospera em proporção à condição humana que o sustenta ou se desintegra nas questões de um poder aparente que promova controle regulador de demandas legítimas. E, se entendida a referência localizada na aparência como própria da postura que se respeita, de que servem as atitudes humanas como referências históricas na construção do presente e na projeção do futuro?

Diante disso, busca-se uma resposta na reflexão sobre a indumentária como indicativo expresso de um desencadeamento particular na linguagem que publica determinadas referências antes que um certo regimento as ordene como publicáveis.

Ocorre que tais referências manifestas por intermédio do ser cívico, contudo, não se dá apenas pelo coeficiente da razão. A equação historicamente sugerida em função de superações de cunho científico-filosóficas, tais como a questão da relatividade em Einstein ou a da ontologia da realidade em Maturana, por exemplo, talvez se apresente mais complexa que a relação entre dívida e divisa no seio das Ciências Sociais.

O poder plasmado nas relações competitivas que trouxe a reboque, de uma noção caótica, o dever como fator ético de orientação cível, sofre atualmente um revés significativo. Competir significa, na acepção econômica da palavra, levar vantagem em relação à outra coisa e, dado ao estado de fluidez e de volatilidade que alcançou a economia de mercado frente aos parâmetros gerais de globalização que imperam sobre a condição e a condução civilizacional, a noção de poder tende ao rompimento da corrente do reboque ético. Seguindo, assim, por força de um dever corrompido pela falsa noção de sobrevivência que a coisa representa, uma ordem que nega a ação como instrumento relativo de interferências ontológicas.

Disso resulta que o dever assume um lugar sagrado como vetor dessa sobrevivência, por um lado, superdimensionada em padrões cumulativos consumistas, e, por outro, cada vez mais miserável em proporção às dívidas assumidas por conta de créditos que a viabilizem. Desse modo, o poder econômico se hegemoniza como condutor de um processo que abandonou o vagão do dever ético por uma falsa noção de liberdade que se mantém, em última instância, as custas de uma guerra sem divisas e indiscriminadamente violenta.

A idéia de divisa, desvinculada da questão ética, se confunde com a idéia de vantagem determinada por estruturas competitivas de poder. Isso significa divisão conflituosa em qualquer campo de ação que as linhas divisórias estabeleçam limites ou as contingências exigiriam a cooperação entre as partes, dada a natureza coordenada da linguagem que estabelece o meio propício à vida humana. Nesse sentido, as aparências remetem às questões ontológicas da vida humana ou se configuram em cenários espetaculares para representações de futuro coordenado em decorrência de um rompimento histórico com o fator ético de poder.

Se a condição para o haver como pertencimento for entendida apenas na relação entre o crédito e o débito, os laços entre uma folha de árvore e o galho que a sustenta, por exemplo, ao partirem das mesmas raízes profundas e das mesmas superficiais, assumiriam uma competição para que tais existências se isolassem por conta de débitos com estas ou aquelas raízes nas evoluções da folha e do galho. O que ocorre, ao invés disso, é que tanto a folha quanto o galho, como que argumentos históricos que surgem em momentos distintos, cooperam na formação da árvore. Desse modo, uma espécie de mentalidade do dever se estabelece no processo da existência de ambos para que a árvore se forme.

A noção de dívida assumida pala razão mercadológica, nesse sentido, ao discriminar as fontes que alimentam o haver e o dever dentro do processo civilizacional, discrimina civilmente os seres por conta de um comprometimento que pressupõe a aparência como determinante processual, o que se afigura uma folha estática entre o galho e a sarjeta.

A questão da divisa topográfica dessa razão, relacionada aqui à forma da árvore frutífera e suas reações derivadas de um encadeamento específico como, por exemplo, o resultante dos cuidados dispensados para a revelação da postura aparente, se discute pelos argumentos excludentes de uma estética da maquiagem. Isso quer dizer que a dissolução das divisas, percebida na lógica mercantilista global na medida em que se fluidificam os territórios, se dá pelo câmbio das questões de disciplina para as de controle.

O tratamento antes dispensado à árvore em forma de poda adequada e de cuidados específicos quanto ao meio propício ao desenvolvimento desejado, agora se faz pela admissão de produtos químicos que controlam fluxos e monopolizam territórios em nome de uma agregação excludente por origem. Ou seja, a poda no momento preciso, do ponto de vista técnico, corresponde à aparência dos frutos na ponta desse processo.

Roberto Bittencourt

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