quinta-feira, janeiro 25, 2007

Infância


Ainda nem há viaduto por sobre o trevo e os eucaliptos cintilam na faceirice do ar soprado da serra desde suas entranhas brotadeiras onde vinga o Marumbi. Vê-se de longe a fileira de um verde esmeraldeado à luz do dia fosco. Quinhentas e tantas manhãs formam a pequena mão que esconde uma parte do cabo amarelo e a areia incerta derrama em sopro de poeira. Outra e outra e outra..., até que a mira de um muro anoiteça o douro da areia soprada que se acumula ao redor do grená do balde. Nuvens de zinco cochilam à lentidão do meio-dia esticado na rigidez asfáltica de uma ponte que leva à tarde.

Do sono da sesta brotam formigas do nada e falam fininho ao brilho cantado que sai de um sol de mil vozes:
No azul de fermento
Os cascos do vento
Sovam estrelas
Num céu de farinha
Cresce e cresce o veludo do som borboleta que engole o passado e vira gosto de gelatina vermelha grudada nos dentes. De mosca é o furo preto no teto, de cá para lá feito um buraquinho de asas sem nada dentro, ora pinta na perna suada, ora no vidro sem aviso.

Não tem tijolo na cor da terra do buraco que dentro da água encheu a unha e só saiu um pouco. Sem água nem fica tanto, mas pode o pó arder no olho que nem a fumaça que sai da vela e cheira esquisito. O copo e a tiara, tingidos de mão e de cabelo parecem vidro de janela que virou água e secou desses jeitos para sempre, até que quebrem e dê medo doer no pé cheio de sangue. Já é de cobre a nuvem que cobre um pedaço do azul no fundo da casa e tem o tamanho de uma fumaça pequena que sai de um fogo que tem dentro do sol. Parece que tudo é um olho fechando devagar e que dentro dele tudo vira estrela.

Roberto Bittencourt

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