A profunda impressão de um duplo suicídio não passa pelo gargalo de apelos sensacionalistas cotidianos. Passa, sim, pela percepção que apalpa as dobras do tempo para compor a história, passa pela garganta seca que revela a chama poética de um pertencimento verdadeiro.
No filme Lost Zweig, de Sylvio Bach, o suicídio, em si, é uma tangente traçada entre a linguagem humana como coerência de ações individuais precisas e a insuficiência de um domínio que não se adota, de um espírito que se pauta apenas pela lógica de uma configuração histórica em detrimento da vida como “metabolismo” da existência. O efeito de um contraste entre o mote para o duplo suicídio e uma narrativa que privilegia, quase que de forma lúdica, a imagem de um período nebuloso resulta na primorosa contextualização de espaços culturais autênticos; apresenta elementos de uma época, sem, contudo, estabelecer referências que possibilitem passividade frente à obra.
Em Lost Zweig, o amor e o jogo se espelham, por um lado, numa lista que, ao contrário de Schindler, Zweig não obteve êxito em salvar da ira nazista os seus componentes, e, por outro, num tabuleiro de xadrez onde o paradoxo de um jogo solo põe em cheque a própria vida. Lotte, esposa de Zweig e protagonista dos suicídios, junto ao marido, por sua vez, move-se compassiva ao ritmo de uma solidão introjetada nas próprias veias que culmina num derradeiro gesto de “esperança”.
Roberto Bittencourt
Texto originalmente publicado no jornal O Estado do Paraná.
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