quarta-feira, outubro 11, 2006

DA LUZ À PALAVRA

Quando você menos espera uma abelha aparece do nada e, pra começo de conversa, invoca que o seu copo de água sobre a mesa é qualquer coisa de um aroma insuportavelmente atraente. Flana por cá e por lá, faz que pousa e arremete, ora à janela, ora ao seu ouvido que ouve a direção tomada pelo zumbido veloz das asas. Você pensa se concentrar no texto e olha fixamente para a última palavra quando a danada, num rasante, desliza por sobre o teclado.

Toca o interfone e você esquece a dita cuja. Recebe seu amigo que continua o mesmo bonachão e engraçado dos dias trabalhados juntos na sala de redação e arte da companhia e o texto fica pra depois. Conta e ouve disso e daquilo; toma um café e tem sempre alguém de aniversário, alguém que sumiu – não deu mais notícias, outra que apareceu, o blog, a idade de um filho, a lamentável conduta de um vizinho que insiste em ignorar seu olhar amistoso.

Novamente sozinha e você se apruma, dedicada ao trabalho, precisa consigo no trato de cristais em sínteses e sintaxes. Torna ao texto. Agora uma sabiá encanta a manhã de outubro e puxa sua atenção, referida em tantos cantos de tantos momentos, para o floreio de um arrepio sobre a pele. Aí você lembra da abelha e imediatamente intui a ausência dela no recinto; olha em seu entorno e constata quase tudo como antes. A não ser por este texto você não faz sentido neste momento de multidão e colméia.

Nada disso importa se no dia seguinte, ao abrir a porta da sala, você tem a visão mais de criança feliz que jamais teve desde que se lembre. Ângela passa na simplicidade de março que lhe cai tão bem nesta primavera e faz do momento o mais possível que possa lhe coexistir em poesia. Uma atmosfera de broto de gramínea lhe invade e provoca a sensação de um passe, de uma lágrima temperada a tempo de você receber livre e comemorar mais um momento da luz à palavra.

Sorvência Lanowa

2 comentários:

Roberto Bittencourt disse...

So, querida, adorei esse texto e mesmo antes de sua autorização postei. Tenho certeza que você não vai se opor.

Um beijo

Anônimo disse...

Sem problemas, Bitten.
Beijo
SL